O PAT foi criado em 1976 como uma das políticas de combate à fome. Para isso, criou-se um incentivo para as pessoas jurídicas propiciarem alimentação de seus empregados
Em nota técnica na 20ª Carta de Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), analisei o recente Decreto nº 10.854, da Presidência da República, que altera o regulamento do PAT – Programa de Alimentação do Trabalhador. O PAT foi criado pela Lei 6.321, de 14 de abril de 1976, e se encontrava regulamentado até novembro de 2021, pelo Decreto nº 5, de 14 de janeiro de 1991. Esse decreto foi integralmente revogado, com a regulamentação da Lei, nos artigos 166 a 182, por meio de outro decreto, o 10.854, de 10 de novembro último.
Atendendo a legislação brasileira sobre alteração da legislação trabalhista, em janeiro de 2021 iniciou-se uma consulta pública pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, sobre a minuta de decreto que instituía o “Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas e o Prêmio Nacional Trabalhista”.
A referida minuta continha 182 artigos, e inicialmente a consulta seria encerrada em 5 de março. Todavia, em razão das polêmicas contidas no texto da minuta, ocorreram prorrogações no prazo de consulta e o texto final na forma de decreto foi publicado no Diário Oficial da União em 10 de novembro de 2021, com o número 10.854.
Manifestações contrárias
Ainda durante a fase de consulta, entidades ligadas mais diretamente ao Direito do Trabalho, como a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat) e o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), manifestaram-se contrariamente.
Segundo as entidades, a edição de um decreto que, a pretexto de regulamentar disposições legais, visou à instituição do Prêmio Nacional Trabalhista e do Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas. Mas também a revisão e a consolidação de 31 decretos.
As centrais sindicais também responderam à consulta com duras críticas à iniciativa governamental. Porque abre a possibilidade de que até uma ONG seja legitimada a cumprir um papel que constitucionalmente é assegurada aos sindicatos. E por considerarem evidente a intenção de reduzir o protagonismo do movimento sindical, o que por sinal já está em curso desde o golpe de 2016 e da reforma trabalhista aprovada em 2017.
Porém, passados 11 meses do início da consulta pública, o decreto publicado preserva, em sua quase totalidade, o texto inicial divulgado.
Surpresas
As questões relativas ao PAT estavam sendo debatidas no Conselho Nacional do Trabalho. Trata-se de órgão de consulta do qual fazem parte o recriado Ministério do Trabalho e Previdência, as centrais sindicais e as confederações patronais. Mas os participantes representantes dos empregados e dos empregadores receberam com surpresa a inclusão do tema no novo decreto.
No artigo 177 do novo decreto, as operadoras de vale-alimentação ficam obrigadas a “permitir a interoperabilidade entre si e com os arranjos de pagamento abertos” (Brasil, 2021). Sendo assim, será permitido ao trabalhador utilizar o vale-refeição em qualquer estabelecimento, independentemente de credenciamento.
Além disso, o novo decreto possibilitará a flexibilidade de bandeira e ainda dará ao trabalhador a chance da “portabilidade gratuita do serviço de pagamento de alimentação oferecido pela pessoa jurídica”, conforme consta no artigo 182”.
Porém, há um prazo para as empresas se adequarem, visto que, as alterações referentes ao PAT começam a valer somente 18 meses após a publicação do decreto. O texto presidencial foi publicado no último dia 11 de novembro de 2021, logo, somente no início do ano de 2023 finda o prazo para as empresas se adequarem e os trabalhadores se beneficiarem das novas regras.
O PAT foi criado em 1976 como uma das políticas de combate à fome, e para isso, criou-se um incentivo para as pessoas jurídicas propiciarem alimentação aos seus empregados por meio de restaurantes próprios, ou operados por terceiros, ou até, mediante o fornecimento de “vale-refeição”. Nesse intuito, o governo federal coloca à disposição um incentivo fiscal, com a dedução até o dobro do valor gasto com a alimentação no Imposto de Renda Pessoa Jurídica.
Embora o Decreto 10.854 disponha, entre outros temas, sobre repouso semanal remunerado, vale-transporte, Programa de Alimentação do Trabalhador, gratificação de Natal, mediação na negociação coletiva de natureza trabalhista, estranhamente foi incluída uma alteração no regulamento do Imposto sobre a Renda. A alteração no artigo 645 restringe o incentivo fiscal do Programa de Alimentação do Trabalhador. Somente poderão ser deduzidas despesas de alimentação com os empregados que recebam até cinco salários mínimos.
No entanto, será possível deduzir os gastos com alimentação de todos os trabalhadores da pessoa jurídica, não limitando aos que recebam até cinco salários mínimos, se existir na empresa, serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por meio de entidades fornecedoras de alimentação coletiva.
Em ambos os casos, a dedução limita-se ao valor de no máximo um salário mínimo por empregado.
No âmbito nutricional permanecem em vigor as regras anteriormente estabelecidas através do Ministério do Trabalho e Previdência e pelo Ministério da Saúde, para instalação de serviços próprios de alimentação nas empresas.
Simplificação
Em uma análise a voo de pássaro no texto do Decreto 10.854, podemos concluir que a simplificação da legislação é bem-vinda, pois permite que todos os interessados a compreenda. O PAT perdeu o status de possuir um regulamento próprio, passando a ser regulamentado por esse decreto em meio a outros temas trabalhistas. Os aspectos tributários do Programa de Alimentação do Trabalhador foram colocados no Decreto 9.580, de 2018, que trata do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas.
Além disso, é evidente que os trabalhadores com salários acima de R$ 5.500 somente serão beneficiários do programa se existir serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por parte das empresas. Se o empregador se utilizar do vale-refeição ou vale-alimentação, esse conjunto de trabalhadores estará à mercê de negociação coletiva.
Ao final, feitas as comparações entre o decreto antigo e o decreto novo, podemos afirmar que, somente após a aplicação da nova legislação, e da prática por parte dos profissionais envolvidos no tema e dos próprios trabalhadores será possível saber se as novas regras do PAT serão benéficas ou não.
Fonte : Rede Brasil atual (FEEB SC)