Nos últimos meses, uma série de discussões sobre o comportamento de funcionários e empregadores têm tomado conta das redes sociais. Termos como quiet quitting e quiet firing — ambos ligados à chamada “demissão silenciosa — causaram comoção com suas interpretações imprecisas.
Não há como negar, porém, que por trás de todo esse alvoroço existe uma insatisfação geral no mercado de trabalho. Dentre alguns dos fatores que mais causam descontentamento, estão: poucas ofertas de emprego, baixos salários e a falta de profissionais qualificados.
Após todo o tumulto em torno do movimento, os adeptos da “demissão silenciosa” buscam reformular o termo através do acting your wage – que significa trabalhar o equivalente ao que ganha. No geral, os funcionários só desejam realizar o trabalho pelo qual são contratados, sem ultrapassar os seus limites pessoais.
O Canaltech conversou com dois especialistas sobre o tema, a fim de trazer reflexões de como as empresas devem encarar os movimentos e como os funcionários podem ajudar a transformar o ambiente de trabalho.
Em tese, fazer o que é esperado da sua função não deveria significar nenhuma perda para a empresa ou para o funcionário. Especialistas apontam que a preocupação começa quando essa limitação se transforma em falta de motivação para se permitir aprender coisas novas e evoluir dentro da companhia.
Mateus Magno, CEO da Sambatech e Samba Digital, acredita que o ponto-chave é estabelecer o equilíbrio. “Não existe trabalho sem desafio, o sofrimento, o estresse e a ansiedade fazem parte de qualquer situação da nossa vida e posso dizer hoje, como CEO, que quanto mais alto o nível de decisão, maior a pressão”, explica.
Magno ressalta que a produtividade também depende de uma vida divertida, com propósito e de boas horas de sono. Para ele, uma habilidade essencial para proteger a saúde mental no ambiente de trabalho, é saber regular essa pressão – o que exige muita autoconsciência. “A grande questão é saber estar bem mesmo quando o cenário é mais hostil”, pontua.
Já Joceline Abe, diretora de Cultura & Pessoas da Zup – empresa de tecnologia do Itaú, o problema está quando o acting your age vem como uma limitação, que pode levar o funcionário a ser menos pró-ativo, colaborativo ou até ser menos motivado a novos aprendizados, “porque isso poderia lhe tirar o foco da sua entrega”.
A diretora acredita que é importante ter equilíbrio e abertura para diálogo na empresa, com uma liderança que consiga, inclusive ponderar os prós e contras de alguém que queira fazer apenas aquilo que se espera de sua função. “Tudo é uma questão de alinhamento de expectativas entre as partes (empresa e funcionário)”, ressalta.
Geração Z transforma o mercado de trabalho a cada dia
Com o aumento nos casos de síndrome de burnout ao redor do mundo, a busca por equilíbrio entre a vida profissional e pessoal fizeram com que as novas gerações adotassem novos comportamentos, exigindo ambientes de trabalho mais flexíveis e saudáveis.
Quando questionada sobre o porquê grandes empresas temem movimentos que buscam rotinas de trabalho mais equilibradas, Abe diz que isso se dá devido ao mito de produtividade. Ela alerta que este modo de pensar está cada vez mais obsoleto, visto que a geração Z vem transformando o que entendemos da relação de trabalho.
“Eles vêm com um mindset de mais qualidade de entregas, independentemente de quanto tempo se passa dentro da empresa, aliado a um modelo laboral de mais flexibilidade, autonomia e qualidade de vida. A empresa que não enxergar e entender esta nova onda de trabalhadores, vai perder atratividade e engajamento de seus colaboradores, além de ter que arcar com custos de absenteísmo e queda de produtividade”, diz a diretora.
Como as empresas podem tornar o ambiente de trabalho mais saudável?
O Brasil é o segundo país com maior número de casos de síndrome de burnout (Imagem: Reprodução/Pexels)
A comunicação é sempre o ponto-chave nas questões de saúde mental. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) demonstram que doenças como depressão e ansiedade cresceram cerca de 25% após a pandemia de Covid-19.
Uma empresa deve estar preparada para acolher funcionários que estejam passando esse tipo de situação e manter um ambiente aberto para discutir melhorias. Para Magno, “é preciso oferecer um ambiente de segurança psicológica e escuta ativa, para que as pessoas se sintam confortáveis para falar sem serem retalhadas, que exista (na prática) uma cultura de autonomia”.
Joceline aponta que a empresa precisa criar um ambiente de confiança para que estes assuntos possam ser discutidos e tratados internamente. “Não é só prover um bom plano de saúde ou benefícios que contemplem o cuidado ou prevenção da saúde física e emocional”, afirma.
Incentivando o funcionário
Em momentos de crise, não há como negar que recompensas monetárias são um ótimo incentivo para um bom desempenho no trabalho. No entanto, nem sempre isso é o suficiente. Existem diversas maneiras de se valorizar um colaborador que vão além da questão financeira.
Segundo Mateus Magno, é preciso reconhecer as grandes e pequenas conquistas, estando junto quando erros acontecem. É sobre acolhimento, direcionamento, ser vulnerável e criar um ambiente de confiança. “É olhar para a carreira junto com a pessoa, e, por consequência, o líder estará muito mais apto a entender se a remuneração do seu liderado está coerente com as suas entregas”, pontua.
Para Joceline Abe, nada substitui uma liderança que saiba engajar seus liderados. As pessoas precisam se sentir valorizadas, ter clareza de que estão contribuindo para um todo e perceber que estão aprendendo, evoluindo, sendo pertencentes a algo. “São necessidades básicas do ser humano”, afirma.
Abe finaliza ressaltando a importância do papel das lideranças: é preciso haver diálogo, abertura e tempo de qualidade para investir no desenvolvimento das pessoas. Para ela, o reconhecimento, o aumento da remuneração, os demais incentivos e consequente engajamento (o famoso “vestir a camisa”) virão como consequência desta equação.
Saúde mental em primeiro lugar
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estimam que diagnósticos de depressão e ansiedade custam cerca de US$ 1 trilhão (R_jobs(data.conteudo)nbsp;5,21 trilhões) à economia mundial anualmente. São perdidos cerca de 12 bilhões de dias de trabalho todos os anos devido a doenças ligadas à saúde mental.
As empresas só tem a ganhar ao manter um ambiente e saudável e uma rotina equilibrada para seus funcionários.
Fonte: Canaltech (FEEB SC)