A manutenção de uma taxa básica de juros elevada por parte do Banco Central tem permitido aos bancos auferirem grandes lucros. A persistente política do Banco Central levou o país a ter a maior taxa real de juros do planeta. (Por Vivian Machado)
A manutenção de uma taxa básica de juros elevada por parte do Banco Central (a Selic, a 13,75% ao ano) tem permitido aos bancos auferirem grandes lucros, que ganham por diversas de suas contas. Todavia, o endividamento e a inadimplência das famílias brasileiras bateram recordes nos últimos meses, prejudicando a economia do país. E, mesmo com a alta da inadimplência, os ganhos com juros altos garantiram resultados positivos e não desprezíveis para os bancos, apesar dos provisionamentos extraordinários que fizeram em resposta ao risco de um grande prejuízo advindo do “Caso Americanas”.
Ademais, os bancos seguem reduzindo o número de bancários, substituindo-os por outros profissionais; fechando agências tradicionais e optando por formatos menores, com menos pessoas no atendimento, sempre visando menos custos e mais lucros. A íntegra desse estudo compõe a 26ª Carta de Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), disponível em: www.uscs.edu.br/noticias/cartasconjuscs.
A persistente política do Banco Central levou o país a ter a maior taxa real de juros do planeta (que, descontada a inflação, está em 9,5% a.a.), fazendo com que as demais taxas aplicadas pelos bancos sejam bem maiores. Os juros do rotativo do cartão de crédito para pessoa física, por exemplo, chegaram a 430% a.a. em março de 2023. Este cenário dificulta a retomada do crescimento da economia, um desenvolvimento mais justo e igualitário no país e a evolução da produção, emprego e renda, favorecendo, apenas, especuladores e rentistas.
Os bancos ganham com a Selic elevada nos juros das operações de crédito, no rendimento dos títulos públicos, ganham também sobre os recursos retidos no Banco Central (as aplicações compulsórias). Da dívida pública, as instituições financeiras detêm cerca de 30% do total e, só em 2022, o governo pagou mais de R$ 600 bilhões em juros.
Os recursos de suas carteiras de crédito se direcionam, em geral, para as linhas de menor risco, como, por exemplo, o imobiliário e o consignado, que são modalidades com taxas de inadimplência mais baixas, uma vez que os bancos brasileiros são, notadamente, instituições conservadoras com grande aversão ao risco. Mas, ainda assim, consequência da manutenção de juros num patamar tão elevado é o endividamento de grande parte das famílias brasileiras, levando-as à não conseguirem cumprir seus compromissos. De acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), ao final de 2022, 79,3% das famílias declararam estar endividadas, um endividamento recorde, subindo quase vinte pontos percentuais desde o início do governo de Jair Bolsonaro e 88,8% das famílias endividadas tinham dívidas no cartão de crédito, tem as mais altas taxas de juros do mercado.
A inadimplência também bateu recorde em 2022, de acordo com a pesquisa, com 28,9% das famílias com dívidas em atraso e 10,7% do total dizendo não ter condições de pagar suas pendências financeiras. Dados do BC apontam ainda que, ao final de 2022, a inadimplência no rotativo do cartão de crédito chegou a 41% e a 48,3% em março de 2023.
Em 2022, nos cinco maiores bancos do país (Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e Caixa), as taxas de inadimplência para atrasos superiores a 90 dias subiram. O Bradesco, fechou o ano em com 4,3% de inadimplência – a maior taxa entre os cinco bancos. Na Caixa, a taxa foi a menor (2,1%) e no Banco do Brasil, ficou em 2,5%. No Itaú, a taxa de inadimplência ficou em 3,4% e, no Santander, 3,1%. A inadimplência média do Sistema Financeiro Nacional ficou em 3% no ano.
Caso Americanas
Em função da alta da inadimplência, especialmente no segmento pessoa física, os bancos já vinham elevando seus provisionamentos para fazer frente ao risco de futuros calotes, mas, em janeiro de 2023, uma das maiores empresas do varejo brasileiro, a Americanas S.A. divulgou Fato Relevante ao mercado, informando a detecção de inconsistências contábeis em suas demonstrações financeiras de exercícios anteriores, estimadas em cerca de R$ 20 bilhões, que posteriormente se tornou um pedido de recuperação judicial por lançamentos indevidos de cerca de R$ 40 bilhões, afetando diretamente os grandes bancos do país, pois estão entre seus principais credores. Em função desse evento específico, os cinco maiores bancos do país correm risco de terem perdas consideráveis: Bradesco: R$ 4,5 bilhões; Santander (Brasil): R$ 3,6 bilhões; Itaú Unibanco: R$ 2,7 bilhões; Banco do Brasil: R$ 1,3 bilhão; Caixa Econômica Federal: R$ 501 milhões.
Diante disso, as despesas com PDD (provisões para devedores duvidosos) dos cinco bancos cresceram, em média, 62,0% em doze meses, totalizando R$ 126,7 bilhões. Essas movimentações responderam, em parte, pelo fato de que apenas Itaú Unibanco e Banco do Brasil apresentarem alta nos lucros em relação a 2021. Ainda assim, mesmo com o provisionamento extraordinário do período, os lucros dos cinco bancos, somados, atingiram o expressivo montante de R$ 106,7 bilhões, com alta média de 2,5% em 12 meses.
O resultado do Banco do Brasil cresceu expressivos 51,3%, chegando a R$ 31,8 bilhões no ano. O Itaú obteve o segundo melhor resultado com quase R$ 30,8 bilhões no período e alta de 14,5% em doze meses. Os demais apresentaram queda em seus resultados. Bradesco, com lucro líquido de R$ 20,7 bilhões, teve queda de 5,5%. Santander com lucro líquido de R$ 12,9 bilhões e queda de 21,1% em 12 meses. A Caixa, por sua vez, lucrou R$ 9,8 bilhões, com redução de 43,4% no período, resultado que teria sido pior não fosse a instituição ter feito uso de créditos tributários no exercício, levando o saldo da conta de impostos e contribuições subir mais de 720%, totalizando quase R$ 1,8 bilhão, amenizando os efeitos negativos da PDD. Diante desses resultados, a rentabilidade das maiores instituições financeiras do país ou o retorno sobre o patrimônio líquido seguiu o movimento dos lucros, variando entre 14,8%, (Banco do Brasil) e 21,2% (Santander).
Empregos
Com relação ao emprego, o saldo nos balanços foi positivo em 5.280 postos de trabalho abertos no ano. Porém, não se pode afirmar quanto destes são bancários e quantos não são, tendo em vista que as holdings incluem trabalhadores de vários segmentos do ramo financeiro, tais como trabalhadores de TI, financiários, corretores de seguros, trabalhadores de fintechs, entre outros, com os mais variados tipos de contratos.
Todavia, quando se analisa, no mesmo período, a evolução do número de bancários no país pelo Novo Cadastro de Empregados e Desempregados (Novo Caged/MTE), considerando todos os bancos (cerca de 150 instituições financeiras), o saldo observado é menor que o identificado nos balanços dos cinco bancos: 2.827 postos de trabalho bancário abertos. Isso sugere que esses bancos, realmente, estão contratando mais profissionais fora da categoria do que bancários. Os trabalhadores de TI, por exemplo, que alguns bancos já até tiraram da categoria, levando-os para o sindicato de trabalhadores desse segmento.
Menos agências
Nos últimos anos, a aposta dos bancos parece ser em novos formatos de agências, mais compactas e com menos pessoas no atendimento ao público, para o que seus gestores chamam de um atendimento personalizado e especializado, sem deixar de lado os altos investimentos nas mais diversas soluções digitais para tirar seus clientes das agências, aproveitando sua maior utilização decorrente das necessidades trazidas, especialmente após a pandemia da Covid-19, em 2020. Apenas a Caixa não tem alterado o número de suas agências nos últimos meses. Os demais fecharam 617 agências físicas tradicionais em 2022.
Vivian Machado. Mestre em Economia Política pela PUC-SP. Graduada em Ciências Econômicas pelo Centro Universitário Fundação Santo André. Atualmente, técnica do Dieese e colaboradora do Observatório CONJUSCS. (Fonte: RBA)
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